17 de setembro de 2021 - Uma das grandes dúvidas sobre o tratamento da doença de Parkinson diz respeito ao momento de realizar a cirurgia de estimulação cerebral profunda (DBS, do inglês Deep Brain Stimulation). Segundo o Dr. Rubens Gisbert Cury, neurologista do grupo de distúrbios do movimento da Universidade de São Paulo (USP) e coordenador do ambulatório de DBS do Hospital das Clínicas da USP, é prematuro dizer que a estimulação cerebral profunda reduz a progressão da doença de Parkinson. “Há estudos pré-clínicos, mas ainda falta confirmação. Então, não se deve indicar estimulação cerebral profunda na fase precoce da doença”, disse ele, afirmando, entretanto, que há mudanças em relação à indicação de estimulação cerebral profunda na fase moderada da doença de Parkinson. O médico foi um dos palestrantes do painel Controvérsias na doença de Parkinson, realizado on-line no dia 06 de setembro, durante o XXIX Congresso Brasileiro de Neurologia.
Segundo o Dr. Rubens, a Food and Drug Admnistration (FDA) dos Estados Unidos liberou em 2020 um estudo multicêntrico de fase 3 sobre a estimulação cerebral profunda nos estágios iniciais da doença, o que poderá trazer mais esclarecimentos sobre tema. [1] Atualmente, os critérios de indicação para estimulação cerebral profunda em pacientes com doença de Parkinson são: ter recebido o diagnóstico há no mínimo quatro anos, resposta à levodopa de pelo menos 33% e sintomas descompensados.
“A principal indicação é no caso de complicações motoras refratárias (discinesia ou off) com muita flutuação; o segundo perfil mais indicado é em caso de tremor refratário apesar da medicação; e, por fim, para aqueles que têm intolerância medicamentosa e por isso tomam altas doses de dopaminérgicos”, informou. Trabalhos recentes indicam que o tempo médio de Parkinson indicado para cirurgia varia de 10 a 16 anos. [2]
Em geral, a cirurgia vinha sendo indicada na fase moderada para pacientes com complicações motoras avançadas, ou seja, com muita discinesia, muito off e sem alternativas terapêuticas. O Dr. Rubens disse que houve mudanças nesse ponto: a indicação passou a ser feita na fase moderada, mas diante de complicações motoras também moderadas, porque o risco cirúrgico é menor e o pós-operatório é melhor. “Não tem por que esperar até a complicação motora ficar muito grave”, afirmou. Foi constatado que esses grupos apresentam melhora na qualidade de vida. [3]
A hipersensibilização medicamentosa é outro argumento importante. [4] Ao aumentar muito a dose de medicamento em pacientes com complicações motoras há uma hipersensibilização pós-sináptica, de forma que, com a mesma dose de medicamentos, se induz muito mais discinesias e alterações comportamentais não motoras, como impulsividade e desregulação dopaminérgica. Essa hipersensibilização pós-sináptica pode ser parcialmente irreversível. “Depois da cirurgia, mesmo reduzindo os remédios, o paciente pode ter uma dificuldade no manejo medicamentoso, e a DBS entraria justamente para evitar o aumento dos medicamentos”, explicou o Dr. Rubens.
A cirurgia tem efeito por 15 a 17 anos, como foi demonstrado em um artigo recém-publicado no periódico Neurology. [5] “É óbvio que outros sintomas avançam, principalmente a parte cognitiva, mas para os sintomas que a DBS se propõe a tratar, ainda existe um controle em muito longo prazo”, afirmou o neurologista.
Parkinson é uma doença priônica?
Outra controvérsia discutida no painel foi se a doença de Parkinson seria uma doença priônica. O príon é uma proteína infecciosa, malformada, que pode se espalhar e infectar células saudáveis, causando uma autopropagação, explicou a Dra. Arlete Hilbig, que é neurologista do Centro de Doença de Parkinson e Distúrbios do Movimento da Universidade Federal de Ciências da Saúde de Porto Alegre e Irmandade da Santa Casa de Misericórdia de Porto Alegre (UFCSPA/ISCMPA). A Dra. Arlete disse que o questionamento da relação com o processo priônico começou com a identificação da alfa-sinucleína, proteína associada à doença de Parkinson, cuja propagação seria similar à do príon, de célula a célula.
“Há inconsistências em relação à propagação pela alfa-sinucleína”, afirmou a médica. O modelo não explica todos os casos clínicos e a distribuição anormal da patologia. Além disso, a proteína nem sempre segue uma conectividade neuroanatômica, e pacientes com sintomas avançados e certas formas genéticas não necessariamente têm corpos de Lewy; portanto, não têm o depósito da alfa-sinucleína. Segundo a Dra. Arlete, ainda é preciso esclarecer essas inconsistências para entendermos o desenvolvimento e a progressão da doença de Parkinson. Fonte: Medscape.
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