Mostrando postagens com marcador vespa. Mostrar todas as postagens
Mostrando postagens com marcador vespa. Mostrar todas as postagens

quarta-feira, 26 de novembro de 2025

Pesquisa revela benefícios do veneno das vespas em novos medicamentos para doenças neurodegenerativas

Imagem de um ninho da vespa social Polybia occidentalis, espécie presente no estudo. (Créditos: acervo pessoal/Márcia Mortari)

26/11/2025 - As doenças neurodegenerativas — como a Doença de Alzheimer (DA), a Doença de Parkinson (DP) e a Epilepsia do Lobo Temporal (ELT) — estão entre os maiores desafios da saúde pública contemporânea. São condições progressivas e de alto impacto social, para as quais ainda não existem terapias capazes de impedir a evolução da doença.

É nesse contexto que surge o projeto “Novos tratamentos bioinspirados e associados à nanotecnologia, educação e prevenção contra as Doenças Neurodegenerativas”, com apoio da Fundação de Apoio à Pesquisa do Distrito Federal (FAPDF) em parceria com o Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) por meio do edital Programa de Apoio a Núcleos Emergentes (PRONEM) de 2020.

A iniciativa é coordenada pela professora Márcia Renata Mortari, do Instituto de Ciências Biológicas da Universidade de Brasília (UnB), que conquistou o 1º lugar do Prêmio FAPDF Destaca na categoria Pesquisador Inovador – Setor Empresarial. A investigação parte de uma premissa bioinspirada: moléculas presentes na natureza podem orientar o desenvolvimento de novos medicamentos — especialmente compostos neuroativos encontrados em peçonhas de insetos.

Segundo a pesquisadora, a observação do comportamento das vespas sociais levou à hipótese de que sua peçonha poderia conter moléculas com ação sobre o sistema nervoso.

Professora Márcia Renata Mortari, coordenadora do projeto, segurando o troféu do 4º Prêmio FAPDF. (Créditos: Marck Castro)

Essas vespas, como a espécie Polybia occidentalis, utilizam o veneno para paralisar presas, indicando a presença de compostos que afetam diretamente a atividade neuronal. A partir disso, o grupo formulou a hipótese de que tais moléculas poderiam ser purificadas e testadas contra doenças neurológicas e neurodegenerativas, dando origem à plataforma de peptídeos estudados no projeto.

O termo peptídeo refere-se a pequenas cadeias de aminoácidos — moléculas menores que proteínas — capazes de interagir de forma muito específica com estruturas celulares, o que as torna candidatas interessantes para o desenvolvimento de fármacos mais seletivos e seguros.

Peptídeos inovadores e nanotecnologia avançada

Os três peptídeos bioinspirados desenvolvidos pela Rede têm apresentado resultados expressivos:

Neurovespina: investigada por seu potencial antiepiléptico e neuroprotetor;

Fraternina: com atividade neuroprotetora em modelos de Doença de Parkinson;

Octovespina: capaz de interferir na agregação de beta-amiloide, proteína que se acumula no cérebro em casos de Alzheimer.

No caso da epilepsia refratária — quando as crises não respondem adequadamente aos tratamentos convencionais — a Neurovespina já avançou para ensaios clínicos em cães, conduzidos em parceria com o Hospital Veterinário (HVet).

Os estudos experimentais também investigaram o impacto da Neurovespina em regiões como o hipocampo e a substância negra, áreas essenciais para memória, regulação elétrica do cérebro e controle motor. A substância negra, por exemplo, é uma das regiões mais afetadas na Doença de Parkinson, por abrigar neurônios dopaminérgicos essenciais ao movimento.

Nanossistemas de liberação — o papel da nanotecnologia

Para que um fármaco atinja o sistema nervoso central, ele precisa atravessar a barreira hematoencefálica — uma barreira natural que protege o cérebro e impede a entrada de substâncias potencialmente tóxicas. A nanotecnologia é uma estratégia importante para superar esse desafio.

Os pesquisadores desenvolveram nanossistemas de liberação, pequenas partículas em escala nanométrica que:

protegem os peptídeos contra degradação,

aumentam a estabilidade e solubilidade,

favorecem a chegada ao cérebro,

permitem administração intranasal, rota que oferece acesso mais direto ao sistema nervoso central.

Os estudos indicam que a Neurovespina nanoencapsulada mantém a mesma eficácia do composto livre. Além disso, quando administrada uma vez ao dia por via intranasal, sustenta a redução das crises ao longo do período crônico, sugerindo maior tempo de ação e melhor conforto terapêutico.

A segurança farmacológica vem sendo avaliada por três linhas metodológicas complementares: ensaios in vitro, com culturas de células neuronais; ensaios in vivo, em modelos animais; bioinformática, para prever interações moleculares, estabilidade e possíveis efeitos adversos.

Essa abordagem integrada permite identificar não apenas a eficácia, mas também potenciais riscos cardíacos, neurológicos e metabólicos — essenciais no desenvolvimento de um futuro medicamento.

A cooperação multidisciplinar tem sido um diferencial do projeto: neurocientistas, farmacologistas, químicos, especialistas em nanotecnologia e equipes internacionais analisam conjuntamente os dados e refinam os métodos, garantindo maior robustez científica.

Impactos científico e social 

Os resultados da pesquisa têm potencial para transformar o manejo de doenças neurológicas refratárias, tanto na medicina humana quanto veterinária. 

Novas terapias podem reduzir a frequência e intensidade das crises, melhorar autonomia e qualidade de vida, diminuir hospitalizações, reduzir custos associados a tratamentos crônicos pouco eficazes.

O estudo também posiciona o Distrito Federal no cenário da biotecnologia baseada em peptídeos, área emergente de alta complexidade tecnológica, com potencial para gerar inovação, propriedade intelectual e formação de recursos humanos especializados.

O apoio da FAPDF, segundo a coordenação, foi essencial para consolidar o núcleo de pesquisa e viabilizar etapas de alto custo — desde a purificação dos peptídeos até a execução de ensaios pré-clínicos e clínicos, além da aquisição de equipamentos especializados.

“Apoiar projetos como a Rede Neurobioprospecta é investir em soluções que nascem no Distrito Federal e têm potencial para transformar vidas no Brasil e no mundo. É ciência de excelência gerando impacto real na saúde humana e animal”, afirma Leonardo Reisman, diretor-presidente da FAPDF. Fonte: confap.

sábado, 21 de agosto de 2021

Pesquisa indica potencial de substância extraída da peçonha de vespas para evitar progressão da doença

20/08/2021 - A Doença de Parkinson (DP) é uma doença degenerativa do sistema nervoso central, crônica e progressiva. A doença é causada pela degeneração das células da chamada substância negra, uma região do cérebro cujas células produzem a dopamina, substância responsável pela condução das correntes nervosas para o corpo. A redução ou a ausência de dopamina afeta os movimentos e causa os sintomas. O quadro afeta os movimentos, causando tremores, lentidão, rigidez muscular, alterações na fala e na escrita.

No Brasil, são pouco mais de 200 mil pessoas convivendo com o problema, de acordo com dados da Organização Mundial da Saúde (OMS). Foi pensando em pacientes com essa realidade, que procuram atendimento no Sistema Único de Saúde (SUS), que a pesquisadora Márcia Renata Mortari, da Universidade de Brasília (UnB), desenvolveu uma pesquisa para aprimorar métodos de diagnóstico e avaliar a segurança de novos medicamentos para o controle da doença.

Com fomento da Fundação de Apoio à Pesquisa e Inovação do Distrito Federal (FAPDF), ela coordenou o estudo “Doença De Parkinson Em Foco: aprimoramento de escalas de avaliação cognitiva de pacientes e segurança farmacológica de novos compostos neuroprotetores”.

De acordo com a estudiosa, uma grande limitação para o estudo da progressão da doença, assim como de seu estágio em pacientes atendidos pelo SUS, é causada, em parte, pelo uso de escalas com baixa especificidade, sensibilidade e acurácia que dificultam uma intervenção farmacêutica adequada e uma correta orientação aos familiares, compatíveis com as necessidades dos pacientes. Outra lacuna apontada por ela é a ausência de remédios disponíveis capazes de reduzir ou impedir a evolução da doença.

“Em especial, o diagnóstico precoce dos quadros demenciais pelo rastreio cognitivo é de fundamental importância, pois permite que o apoio ao paciente seja iniciado precocemente, além de possibilitar que o paciente participe das decisões sobre o planejamento futuro de sua vida. Quanto aos medicamentos, até o momento, fármacos utilizados para impedir a progressão da doença com ação neuroprotetora são pouco estudados e não utilizados no tratamento”, afirma Márcia Mortari.

Por isso, os principais objetivos da pesquisadora foram traduzir, adaptar e aprimorar escalas internacionais de avaliação de sintomas não motores (especialmente cognitivos) para aplicabilidade na avaliação e diagnóstico de pacientes no SUS. Outra vertente do estudo avaliou a segurança de novas fórmulas produzidas com o peptídeo neuroprotetor Neurovespina, composto desenhado a partir do protótipo identificado na peçonha de vespas sociais.

Vespas sociais (Foto: divulgação)

Adaptação de escalas para diagnóstico

Duas escalas foram avaliadas e adaptadas pelos pesquisadores: Escala de Avaliação Cognitiva da Doença de Parkinson (PD-CRS) e Cambridge Neuropsychological Test Automated Battery (CANTAB).

Para avaliação da PD-CRS, foram considerados 640 indivíduos saudáveis (40 anos ou mais) de cinco regiões brasileiras distintas. A escala foi adaptada para o Português e validada através de comparação com testes neuropsicológicos amplamente utilizados: Teste das Trilhas, teste dos Trigrama-consonante, Teste dos Cinco Pontos, Fluência verbal (frutas e animais).

“PD-CRS é uma escala com alta capacidade de triar, discriminar e diagnosticar de forma precoce graus leves de perda cognitiva em pacientes com doença de Parkinson, diferentemente de outras escalas neurocognitivas utilizadas na prática clínica atual”, destaca a coordenadora da pesquisa.

De acordo com os resultados atingidos, a escala demonstrou adequada reprodutibilidade e fidedignidade, podendo ser considerada válida como método diagnóstico. A PD-CRS mostrou-se uma escala com alta capacidade de triar, discriminar e diagnosticar, de forma precoce, graus leves de perda cognitiva em pacientes com doença de Parkinson, diferentemente de outras escalas neurocognitivas utilizadas na prática clínica atual.

Já a CANTAB é uma plataforma digital de mensuração de funções cognitivas com ampla aceitabilidade internacional no meio de pesquisa em neurociência cognitiva e no diagnóstico neuropsicológico. No estudo, ela foi aplicada em 30 participantes voluntários subdivididos em DP-CN (Doença de Parkinson – Cognição Normal) e DP-CCL (Doença de Parkinson – Comprometimento Cognitivo Leve). A escala demonstrou adequada validade do teste cognitivo.

Potencial medicamento

Além da adaptação das escalas para diagnóstico, a pesquisadora também testou a segurança de fórmulas produzidas a partir do peptídeo neuroprotetor Neurovespina, presente na peçonha de vespas sociais.

“Os peptídeos bioativos têm sido excelentes candidatos ao desenvolvimento de novos medicamentos, devido a algumas características da sua atividade biológica, como alta especificidade, potência, baixa toxicidade e diversidades química e biológica. A otimização de peptídeos tem sido muito empregada com o intuito de minimizar problemas inerentes aos peptídeos e viabilizar o uso dessas moléculas como fármacos”, indica Márcia Mortari.

Os resultados do projeto indicaram que a forma injetável da Neurovespina, em doses de 7 e 4mg/KG, foi capaz de reduzir a descoordenação motora e mostrou ação neuroprotetora de neurônios produtores de dopamina na substância negra do cérebro (substantia nigra).

“Este estudo tem revelado que a Neurovespsina é um fármaco promissor capaz de prevenir a progressão da doença e perda neuronal. Além disso, foram realizadas a produção de duas novas formulações, para a administração intranasal”, afirma Márcia Mortari.

A cientista destaca, ainda, que a Neurovespina teve todo o seu perfil de segurança farmacológica avaliado em roedores e primatas, tendo sido bem tolerada sem geração de feitos adversos. Ela ressalta as vantagens do uso da substância, como alta potência, excelente seletividade, baixa toxicidade química e imunogenicidade.

Quanto à importância e aplicabilidade da pesquisa para o SUS, Mortari explica que a disponibilidade de um fármaco neuroprotetor é inexistente até o momento e que “os resultados poderão revolucionar a terapia de desordens neurodegenerativas, proporcionando uma melhora significativa para os pacientes e diminuindo os custos diretos e indiretos no SUS”.

A pesquisa foi fomentada pela FAPDF  “Chamada FAPDF/MS-DECIT/CNPQ/SESDF 01/2016 – Programa de Pesquisa para o SUS: Gestão Compartilhada em Saúde”, cujo objetivo foi apoiar a execução de projetos de pesquisa científica, tecnológica e de inovação que promovam a formação e a melhoria da qualidade da atenção à saúde no Distrito Federal, no contexto do Sistema Único de Saúde (SUS).

Confira a apresentação final de resultados da pesquisa aqui (link "fora do ar"). Fonte: Confap. Veja também aqui: 11/8/21 - Fármaco se revela promissor na luta contra o Parkinson.

Afinal, não se trata de algo novo. Há 3 anos, 10 de fevereiro de 2018, postamos esta notícia AQUI.