18/03/2025 - Em 2018, aos 30 anos, Guillaume Brachet recebeu um diagnóstico improvável para um jovem de sua idade. Pesquisador e professor de Farmácia, casado, com uma filha pequena e em plena ascensão profissional, ele descobriu que tinha Parkinson, uma doença crônica neurodegenerativa progressiva, de evolução lenta, que atinge principalmente pessoas acima de 60 anos.
Adepto de uma vida saudável e praticante de caiaque, entre outros esportes, Guillaume, que vive em Tours, no oeste da França, buscou entender por que desenvolveu a doença de maneira tão precoce. Desde o início, ele nunca se conformou com as poucas opções terapêuticas existentes - a patologia é tratada principalmente com moléculas a base de dopamina, que ajudam a controlar os sintomas mas não impedem a doença de se desenvolver.
Guillaume decidiu pesquisar sobre o assunto e descobriu na literatura científica que a combinação de dois medicamentos contra o diabetes, que já existem no mercado, tinha potencial para frear a evolução da doença. Ele então se dedicou a ajustar as doses para agir contra o Parkinson.
A aposta deu certo: sua ideia foi patenteada e a hipótese comprovada em laboratório, em testes in vitro e in vivo, ou seja, em animais. Para viabilizar a fase da pesquisa com humanos, ele criou em 2023 a start-up CXS Therapeutics. O objetivo era obter respaldo financeiro e logístico para os testes clínicos, que devem começar no próximo ano. Guillaume e sua equipe estão preparando o pedido de autorização para realizar o estudo com os voluntários - entre 150 e 200 participantes devem ser recrutados.
Caso os resultados sejam positivos, a expectativa é que até 2030 o tratamento esteja disponível para os pacientes. "Vamos ter que demonstrar o impacto significativo do tratamento nos parâmetros da doença, e traduzi-lo em algo mensurável e padronizado, como um biomarcador, para provar o efeito dessa combinação na doença", explicou Guillaume Brachet à RFI.
Cientista lança livro
O cientista francês também decidiu contar a saga que vai do seu diagnóstico à descoberta de um possível tratamento em um livro, "Parkinson à 30 ans" ou "Parkinson aos 30 anos", que será lançado no próximo dia 27 de março na França.
Na obra, ele descreve todos os passos que o levaram a aceitar o diagnóstico e buscar um outro tratamento para impedir a evolução da doença, já que dopamina apenas atenua os sintomas. Mas, alguns anos depois do diagnóstico, ele reconhece seus benefícios indiretos.
"No início eu me sentia frustrado porque não havia nada melhor disponível. Mas, no fim das contas, mudei um pouco de opinião, porque a única coisa que sabemos hoje que pode frear a evolução da doença é a prática da atividade física, o esporte", diz.
"No fim, esse tratamento sintomático com a dopamina ajuda o doente a ser mais autônomo e o torna capaz de praticar uma atividade física para lutar contra a evolução da doença. Então, mesmo que o tratamento não atue diretamente no desenvolvimento de Parkinson, traz um efeito interessante e importante para o paciente".
Livro "Parkinson à 30 ans", ou "Parkinson aos 30 anos", que será lançado no próximo dia 27 de março na França
631 quilômetros de caiaque
Após o diagnóstico, o cientista francês conta que teve um período de introspecção e desânimo relacionados ao processo de aceitação da doença, que é irreversível. Mas deu a volta por cima e se envolveu em vários projetos e desafios. Sua meta é aproveitar seu tempo da melhor forma, enquanto ainda for possível, relata.
Em julho de 2024, ele virou notícia no país ao percorrer 631 quilômetros de caiaque em seis dias entre as cidades de Roanne, perto de Lyon, e Paimbouef, próxima de Nantes, no oeste da França.
"Senti a vontade de me engajar com tudo aquilo que estivesse à minha disposição contra a doença. E o esporte era uma das minhas armas. Ele surgiu como um desafio para organizar o crowdfunding necessário para criar a empresa e informar sobre a doença".
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Quero receber
Foi graças a essa e outras iniciativas que ele conseguiu captar cerca de 400 mil euros para montar a CSX Therapeutics e testar o tratamento que pode mudar a vida de milhões de pacientes em todo o mundo. "O livro faz parte de tudo que eu realizei para ajudar a comunicar e ajudar as pessoas a enxergar, não diria a luz no fim do túnel, porque não sabemos ainda se chegamos lá. Mas, em todo caso, transmitir um pouco de otimismo em relação ao que a Ciência e os médicos conhecem sobre a doença", declara.
Sintomas podem "enganar" paciente
O Parkinson se caracteriza pela destruição de uma parte dos neurônios que sintetizam e liberam a dopamina, um dos neurotransmissores cerebrais.
A acumulação de proteínas tóxicas para as células nervosas leva à inflamação do tecido cerebral. A doença gera vários sintomas, além dos motores, que são os mais conhecidos. Entre eles estão problemas de sono, depressão e desconforto digestivo.
Guillaume tinha poucos sinais e demorou para procurar um médico. Ele só marcou uma consulta após comentários feitos por amigos e parentes sobre sua maneira de se movimentar.
"Eu não tinha percebido ou reparado em alguma coisa, mas me disseram que meus movimentos estavam mais lentos. Também me falaram que eu tinha um pequeno tremor na mão esquerda, que eu tinha notado mas não preocupava", conta. "Minha filha era pequena e eu a carregava do lado esquerdo porque sou destro. Então não identifiquei nenhum sintoma mesmo e não levei a sério."
Guillaume só decidiu ir ao médico após testemunhar o infarto de um homem, em quem ele realizou massagens cardíacas, quando almoçava em um restaurante, no centro da sua cidade. Ele conta que estar de frente para a morte o levou a se conscientizar da necessidade de procurar ajuda.
"Sabemos que há fatores de risco, e há riscos maiores se temos um doente na família, mas é impossível antecipar quem terá doença e nem quem tem fatores de risco. Há pessoas com doentes de Parkinson na família e que nunca terão a doença. Então temos fatores de risco, mas não sabemos como prevenir isso", alerta. Fonte: uol.