28 de julho de 2020 - Novos dados sugerem que a estimulação cerebral profunda (ECP – dbs no inglês) do núcleo subtalâmico (NST – STN no inglês) em pacientes com doença de
Parkinson inicial reduz a necessidade de uso de múltiplos medicamentos e o risco de progressão da doença, em comparação com o tratamento padrão, durante cinco anos de tratamento. Segundo os pesquisadores, é necessário um estudo maior para confirmar esses achados, que foram publicados on-line antes da edição impressa em 29 de junho no periódico Neurology.
Os eventos adversos foram semelhantes entre os pacientes submetidos a estimulação cerebral profunda + farmacoterapia e aqueles submetidos a farmacoterapia isolada. Este resultado é uma indicação preliminar da segurança em longo prazo da estimulação cerebral profunda, de acordo com os pesquisadores. Além disso, os pacientes que receberam estimulação cerebral profunda precisaram de uma dose diária equivalente de levodopa (DDEL) significativamente mais baixa e tiveram menor probabilidade de precisar de múltiplos medicamentos do que os pacientes que receberam farmacoterapia isolada.
"Apesar de podermos ficar realmente animados com esses achados, não podemos mudar nossa conduta, o que recomendamos aos pacientes, com base neste estudo", disse Dr. David Charles, médico, professor e vice-presidente de neurologia da Vanderbilt University, nos Estados Unidos. "Precisamos fazer o próximo ensaio clínico para alcançar essa classe de evidências."
Extensão de um estudo piloto
Pesquisas anteriores indicaram que o tratamento com estimulação cerebral profunda + farmacoterapia ideal fornece mais benefícios que a farmacoterapia isolada em pacientes com doença de
Parkinson em estágio intermediário ou avançado. Dr. Charles e colaboradores conduziram um estudo piloto randomizado e cego para avaliar a segurança e a tolerabilidade da estimulação cerebral profunda em 30 pacientes com doença de
Parkinson inicial. Os participantes elegíveis estavam no estágio II da escala de Hoehn e Yahr sem medicação, tinham entre 50 e 75 anos de idade, haviam tomado medicação por seis meses a quatro anos e não apresentavam discinesia ou outras flutuações motoras.
Os pacientes foram randomizados para grupos iguais para farmacoterapia ideal associada a estimulação cerebral profunda em núcleo subtalâmico ou farmacoterapia isolada. Os pesquisadores avaliaram os pacientes a cada seis meses por dois anos. Os resultados sugeriram que a estimulação cerebral profunda no núcleo subtalâmico foi segura e retardou a progressão do tremor de repouso nessa população.
Exceto por pesquisas que incluíram pacientes com doença de
Parkinson avançada, dados sobre acompanhamentos prolongados de pacientes submetidos a estimulação cerebral profunda por doença de
Parkinson são limitados. Estudos prospectivos descobriram que a estimulação cerebral profunda fornece benefícios motores em pacientes com doença de
Parkinson avançada após 5 a 10 anos, mas não incluíram grupos de controle compostos de pacientes randomizados para farmacoterapia isolada. Compreender a durabilidade do efeito da estimulação cerebral profunda é particularmente importante em pacientes com doença de
Parkinson inicial, porque eles podem ser expostos à estimulação por um período maior do que outros pacientes.
Estimulação cerebral profunda pode reduzir a progressão do tremor de repouso
O Dr. David e colaboradores convidaram pacientes que concluíram o estudo piloto para participar de um estudo observacional de acompanhamento. Todos os 29 pacientes que completaram o estudo piloto consentiram em participar do acompanhamento. Os pesquisadores realizaram exames ambulatoriais anuais aos três, quatro e cinco anos após o início do estudo. Esses exames foram semelhantes aos realizados no início do estudo piloto. As pontuações dos pacientes na Unified
Parkinson's Disease Rating Scale (UPDRS) Part III foram obtidas por meio de avaliação cegada de vídeos. A rigidez não foi avaliada. Os pesquisadores calcularam a dose diária equivalente da levodopa dos pacientes e a energia elétrica total fornecida (EETF). Os eventos adversos foram classificados como leves, moderados ou graves.
Devido a um problema com o financiamento do estudo, os pesquisadores examinaram apenas oito pacientes no grupo terapia ideal e nove pacientes no grupo estimulação cerebral profunda no terceiro ano. A análise final incluiu 28 pacientes, porque um paciente não preencheu os critérios de inclusão após a conclusão do estudo.
No quinto ano, a média de idade dos participantes foi de 66,1 anos. Os participantes estavam em uso de medicamentos para doença de
Parkinson há em média 7,2 anos. Nenhuma morte ocorreu durante o estudo. Quatro participantes que foram designados aleatoriamente para farmacoterapia ideal escolheram receber estimulação cerebral profunda de núcleo subtalâmico durante o estudo. Os pesquisadores avaliaram esses participantes com base no grupo de tratamento ao qual eles foram designados na randomização, usando uma análise por intenção de tratar que comparou estimulação cerebral profunda de núcleo subtalâmico precoce + farmacoterapia com farmacoterapia isolada.
Entre os pacientes que realizaram estimulação cerebral profunda precoce, a razão de chances (OR, sigla do inglês, odds ratio) de piores pontuações UPDRS III durante cinco anos foi de 0,42 versus o grupo farmacoterapia isolada. A diferença na pontuação média da UPDRS III entre os grupos devido à randomização foi de 3,70, o que foi uma diferença clinicamente importante, de acordo com os pesquisadores.
No grupo estimulação cerebral profunda precoce, a OR do pior tremor de repouso foi de 0,21 vs. o grupo de farmacoterapia. A diferença entre os grupos no escore médio de tremor em repouso favoreceu o grupo estimulação cerebral profunda. A exclusão do tremor de repouso das pontuações UPDRS III dos participantes eliminou diferenças entre os grupos nas chances de se ter sintomas motores piores e na magnitude da diferença na pontuação dos sintomas motores.
No início do grupo estimulação cerebral profunda, a OR de ser necessária uma maior dose diária equivalente de levodopa foi de 0,26 em comparação com o grupo farmacoterapia. A diferença entre os grupos na média de dose diária equivalente de levodopa favoreceu significativamente o grupo estimulação cerebral profunda. Além disso, no quinto ano a proporção de pacientes que necessitou de múltiplos medicamentos foi de 93% no grupo farmacoterapia e de 43% no grupo estimulação cerebral profunda.
Os pesquisadores não encontraram diferença entre os grupos na prevalência de discinesia no início do estudo. No quinto ano, a prevalência de discinesia foi de 50% no grupo farmacoterapia e de 21% no grupo estimulação cerebral profunda, no entanto, a diferença não foi estatisticamente significativa.
Os grupos do estudo tiveram perfis semelhantes de eventos adversos. Cinco eventos adversos durante o acompanhamento foram relacionados com a cirurgia ou o dispositivo de estimulação cerebral profunda. Dentre os 13 eventos adversos associados ao estudo, o mais comum foi náuseas.
O achado mais significativo do estudo foi que "a estimulação cerebral profunda implantada no início da doença de
Parkinson diminuiu o risco de progressão da doença", disse o Dr. Charles. Nenhum tratamento, incluindo a estimulação cerebral profunda, comprovadamente diminui esse risco. "Esta é uma evidência de classe II. Precisamos obter evidências de classe I antes de alterar a conduta."
Dr. David e colaboradores receberam a aprovação da Food and Drug Administration (FDA) dos EUA para realizar um estudo multicêntrico de fase 3 para obter essa evidência. O novo estudo pode estender os achados sobre estimulação cerebral profunda no estágio intermediário e avançado da doença de
Parkinson à fase inicial da doença, ou seja, pode mostrar que a estimulação cerebral profunda + farmacoterapia no estágio inicial da doença é segura, eficaz e superior à farmacoterapia isolada. "Mas a razão para fazer o ensaio clínico é determinar se a estimulação cerebral profunda altera ou diminui a progressão da doença", disse o Dr. David.
O efeito da discinesia é incerto
"Se um paciente desenvolve problemas que precisam de tratamento com estimulação cerebral profunda, e apenas uma pequena fração dos pacientes com doença de
Parkinson evolui com essa necessidade, então o procedimento pode ser realizado", disse o Dr. Peter A. LeWitt, médico, Sastry Foundation Endowed Chair in Neurology da Wayne State University, nos EUA.
"Um fator de confusão do estudo é que a estimulação cerebral profunda fornece alívio dos sintomas das discinesias se o paciente tiver apresentado o problema após alguns anos de tratamento com levodopa", acrescentou o Dr. Peter. "Para demonstrar que o uso precoce da estimulação cerebral profunda impediu o desenvolvimento de discinesias, o desenho do estudo deveria incluir um período com os estimuladores desligados para determinar se houve prevenção no surgimento de discinesias, em vez de apenas supressão pela estimulação cerebral profunda, como qualquer paciente teria.
"Finalmente, o objetivo de reduzir a dose de levodopa ou o uso de múltiplos medicamentos não justifica submeter um paciente a um procedimento de neurocirurgia que não é isento de riscos e tem custo", continuou o Dr. Peter. "Os resultados deste estudo sem poder estatístico acrescentam à minha opinião que o uso 'prematuro' de estimulação cerebral profunda não é uma boa ideia para o tratamento da doença de
Parkinson."
A Medtronic, que produz o dispositivo de estimulação cerebral profunda usado pelos pesquisadores, financiou parte do estudo. A Vanderbilt University recebe verba para programas de pesquisa e educacionais liderados pelo Dr. David. O Dr. Peter não informou relações relevantes.
Neurology. Publicado on-line em 29 de junho de 2020. Abstract
Este artigo foi publicado originalmente em Mdedge.
Fonte:
Medscape. Veja também aqui:
July 29, 2020 - Electrical stimulation may delay Parkinson’s disease progression.